'É muito cruel as pessoas não te quererem como amigo porque és de outra tradição', diz representante de Comitê Intereligioso no Dia de Combate à Intolerância Religiosa


Em 2022, foram registrados 244 delitos dentro templos religiosos no estado do Pará. Mametu Nangetu integra Comitê Intereligioso no Pará Arquivo Pessoal O Dia de Combate à Intolerância Religiosa é lembrado neste dia 21 de janeiro. A data foi instituída em 2007, em homenagem à Iyalorixá Mãe Gilda, que foi vítima de intolerância religiosa no final de 1999. O relatório do Governo Federal que apresenta um retrato da intolerância e violência religiosa no Brasil entre 2011 e 2015 mostra que o número de denúncias aumentou, era 15 em 2011 e subiu para 252, quatro anos depois. No Pará, foram registrados 244 delitos dentro de templos religiosos em 2022, mas, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública (Segup), não é possível afirmar que os crimes tenham sido praticados em virtude de intolerância religiosa. Apesar de existir o direito garantido pela Constituição à liberdade de religião ou crença no Brasil, a realidade ainda é cruel para quem é praticante de crenças que fogem às tradicionais. A integrante do Comitê Interreligioso no Pará, Mametu Nangetu, do Instituto Nangetu de Tradições Afro religiosas, é militante na causa há vários anos. Ela lembra de vidas que foram perdidas pelo desrespeito à crença do outro. "Já morreram 11 aqui no Pará mas isso não sensibiliza as pessoas porque a ideia da palavra 'proselitismo' significa para elas que 'a minha religião é boa e a tua não presta'. Não gosto da ideia da intolerância porque devemos respeitar e não tolerar". Há quase um ano um jovem que havia completado 20 anos, Vinícius Gonçalves, frequentador da casa de candomblé Mansu Nangetu, em Belém, foi assassinado quando saía do terreiro. Até hoje ninguém foi preso. "Isto não vai mudar enquanto as pessoas não amarem ao próximo, respeitarem, serem afetuosas, que é isso que nós fazemos no Comitê, respeitamos a fé do outro, respeitamos o seu Deus, não importando quem seja, mas se é valioso para você, então eu tenho que respeitar", completa Mametu. A mãe de santo conta que no dia da inauguração da casa o espaço foi apedrejado. "Tive que chamar a Polícia para assegurar o ritual, mas até hoje sofremos esse preconceito. E ele [o preconceito] se dá de várias formas, é quando o galho de uma árvore sagrada cai no terreno do vizinho e ele reclama, é quando você pega um ônibus e ao sentar do lado de uma pessoa ela levanta em sinal de protesto, por exemplo". Mametu faz um paralelo desde que a Lei 11.635 foi assinada em 27 de dezembro de 2007 , a qual instituiu o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, com a realidade em 2023. "Ainda falta avançar muito porque a intolerância começa dentro da nossa casa, quando nossa mãe e nosso pai, vendo TV veem muita coisa contra nós, povos tradicionais de matriz africana. Se vamos há uma delegacia, o delegado diz que é briga de vizinho. Temos vários processos junto ao Ministério Público e nada acontece. Enquanto as pessoas não forem punidas por esse desrespeito vai continuar do mesmo jeito. No dia que começarem a serem punidas, talvez elas repensem quando forem maltratar, jogar pedra ou assassinar os nossos". A representante do Comitê Intereligioso diz ainda que é preciso falar mais no tema, pois é uma questão que afeta a saúde mental. "É muito cruel as pessoas não te quererem como amigo ou não convidarem teus filhos para uma festa ou não virem na tua casa porque és uma pessoa de outra tradição. A palavra tolerar é muito feia, nós precisamos respeitar". Dados no Pará A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) informou que de janeiro a dezembro de 2022 foram registrados 244 delitos que ocorreram em locais como igrejas, templo religioso e centro espíritas em todo o Estado. Em 2021, no mesmo período, houve 325 registros. De acordo com a Segup, foi utilizado na metodologia de pesquisa o local do fato, porém, não é possível afirmar que os crimes tenham sido praticados em virtude de intolerância religiosa. Em 2021, o Governo do Estado lançou o Plano de Políticas Públicas de Defesa dos Povos Tradicionais de Matriz Africana que prevê, entre outras ações, medidas de combate à intolerância religiosa e o preconceito. Como denunciar É possível denunciar casos de intolerância religiosa pelo Disque 100 e pelos canais de comunicação do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. Assista às principais notícias do Pará:

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